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Skinheads do cerrado se unem para reverter imagem negativa do movimento
Brasilienses que seguem o perfil tradicional originado
na Inglaterra lutam contra o estigma neonazista

Por Clarice Gulyas

Para fugir da taxação de grupo neonazista e da associação em ocorrências de violência, os skinheads do Distrito Federal (DF) querem chamar a atenção da população para a identidade originária do movimento skin. Por meio da união dos integrantes de diferentes segmentos existentes na Capital, em sua maioria os Oi!, eles querem ser reconhecidos por combater o racismo e o preconceito.

Jovens entre 15 e 25 anos de idade costumam andar em grupos formados, inclusive, por mulheres. Nada de socos-ingleses, correntes ou facas. Os skinheads do DF apostam no visual descolado como ferramenta principal de expressão social. “Vivemos em um país bonito, sem raça definida e rico em cultura popular. Seria ignorância sermos nazistas no Brasil”, dispara o skinhead Igor*, de 17 anos.

Com cabelos raspados ou não, botas militares (coturno), calças jeans e suspensórios, esses garotos e garotas frequentam ambientes alternativos da cidade em busca de estilos musicais que vão do rock ao reggae. Um dos principais pontos de encontro são as festas da Universidade de Brasília (UnB) e bares localizados no centro de Taguatinga e Sobradinho.

Para Natasha*, 25 anos, o movimento skinhead nada mais é do que um estilo de vida que prega hábitos saudáveis. “Temos uma visão romântica do mundo, somos contra as drogas, o racismo e não apoiamos a homossexualidade por acreditarmos na importância da constituição da família tradicional, mas não temos preconceito algum”, afirma.

Ex-punk, Natasha * tornou-se skinhead Oi! na adolescência após alguns amigos aderirem ao movimento. Ela é uma das poucas mulheres do grupo ao qual pertence, mas representa de forma fiel as skinheads girls por meio do corte de cabelo chelsea e dastatuagens e piercings espalhadas pelo corpo.

Segundo Natasha, o estigma de neonazista carregado pelos skinheads atualmente, refere-se ao modo de se vestir e a falta de conhecimento das pessoas sobre o assunto. “Isso se deve aos partidos políticos britânicos de extrema direita, como o National Front, que invadiram nossa identidade em meados de 1980. A ligação com o nazismo aconteceu por meio da extrema direita conservadora e não durante a Segunda Guerra como os leigos imaginam”, explica.

Em 2007 três pessoas envolvidas com grupos skinheads, punks e neonazistas foram assassinadas no DF. A ex-punk admite a ocorrência de brigas ideológicas dentro do movimento e a existência de gangues violentas que se intitulam skinhead como os White Powers. “Os verdadeiros skiins não concordam com a má conduta, seja o uso de drogas ou a discriminação. Eu nunca agredi verbal nem fisicamente ninguém e mesmo assim tenho o nome sujo na delegacia pelo simples fato de ser skinhead”, diz.

De acordo com um dos representantes do Carecas do Brasil, grupo que reúne skinheads nacionalistas contra as drogas e o racismo no Brasil por meio de um site, o DF é um dos pontos de maior concentração de membros do movimento skin. “Queremos informar aos leigos e curiosos o que é nossa ideologia e também receber novos integrantes. Cerca de 75% dos nossos membros estão localizados em Alagoas, Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Amazonas, Espírito Santo, Minas Gerais e DF”, diz Rafael *.

O especialista em antropologia e sociologia da UnB, Antônio Flávio Testa, vê o crescimento destes grupos dentro do DF como uma busca constante por uma identidade própria por meio da formação de tribos urbanas. “Esse movimento no Brasil e em Brasília não é original. São imitações baratas, vulgares. Não tem a consistência do movimento original. Pode-se identifica-los pelos trajes, produção pessoal, discurso e algumas práticas. Todas as “tribos” urbanas precisam de identidade para se posicionarem, daí ser fácil identificá-los pela produção do personagem”, diz.

O antropólogo também acredita que a contradição entre os diferentes segmentos dificultam a mudança da imagem negativa carregada por esses grupos perante a imprensa. “A mídia divulga ações desses grupos e, eventualmente, pode distorcer fatos com interpretações exageradas. Mas, em linhas gerais, os próprios skinheads fazem questão de tornarem públicas ações agressivas. Há muita contradição entre eles e as imitações de padrões e comportamentos servem para chamar a atenção”, diz.

De acordo com a especialista em psicologia clínica, terapia de família e uso de drogas do Centro de referência, pesquisa, capacitação e atenção integral ao adolescente (Adolescentro), Michelle Falcão, independentemente do tipo de reunião de grupos compostos por jovens, é necessário o acompanhamento da família e da escola para evitar influências negativas como as da violência.
“O impulso para o ato violento é intensificado em grupo. Existe uma falsa sensação de segurança, ou, na verdade, uma superioridade assegurada pelo grupo que facilita a exteriorização de violência. É importante perceber quais são as concepções, a ideologia e os sentimentos dos adolescentes e jovens para o ato violento. É importante gerar reflexões nos grupos, nas escolas, na sociedade; estimular o pensamento crítico – que independe de grupos”, explica.

Violência e preconceito
Crimes praticados por minoria impede reconhecido social do movimento

Agressão sofrida recentemente por um jovem homossexual envolvendo cinco garotos em São Paulo, é atribuída ao movimento skinhead. Na manhã do último dia 14, três jovens que passavam pela Avenida Paulista foram surpreendidos com agressões por um grupo de garotos, um deles maior de idade.

No entanto, em entrevista ao Portal G1 SP, o delegado que conduz o inquérito, Alfredo Jang, descartou a possibilidade de que os agressores sejam skinheads, já que usam roupas normais e não possuem tatuagens.

Segundo Beatriz*, homossexual assumida, após ocorrência em SP, um grupo de skinheads preconceituosos do Distrito Federal ameaçou uma de suas amigas em um bar de Taguatinga. “Ela me ligou para avisar que eu tenha cuidado ao sair. Ela foi abordada por alguns garotos na rua que disseram que vai haver uma ‘lavagem’ em todo o Brasil depois do que aconteceu em SP”,diz.

No DF, as principais vítimas das agressões praticadas por White Powers, ou Boneheads, e neonazistas (geralmente formado por homens entre 30 e 40 anos, e de classe média alta), além de negros e nordestinos, também são os homossexuais.

O presidente da Ong Estruturação (grupo de apoio a lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros), Júlio Cardia, diz que não há ponto crítico de agressão no DF e que os ataques ocorrem de forma inesperada. “Temos muitas ocorrências em diversos locais comuns como em paradas de ônibus, na Rodoviária do Plano Piloto e até na Ponte JK”, diz.

A ong oferece serviço jurídico, psicológico e assistência social às vitimas homossexuais.

Dados
De acordo com os dados da Divisão de Estatítica e Planejamento operacional da Polícia Civil do DF, no período entre 2000 e 2009, foram registradas 39 ocorrências envolvendo grupos skinheads. Taguatinga lidera o rancking com 17 registros, perdendo apenas para Brasília, com 12. Em sua maioria, as ocorrências tiveram o número elevado no ano de 2007, quando três pessoas envolvidas com os movimentos skinhead, punk e neonazista morreram.

Uma das vítimas, era conhecido de Carlos*. “Não gosto de comentar o assunto e nem posso falar o que sei, mas isso foi apenas a ponta de um iceberg. Os caras (assassinos) ainda estão soltos e os chefões, no poder. São gente com grana, mais velha e do meio político”, acusa.

Penalidade
Segundo a advogada criminalista, Ângela Rita Cássia de Oliveira, os principais crimes cometidos por neonazistas no Brasil são de lesão corporal, injúria racial, injúria real (quando também há agressão física), racismo e homofobia.

“O artigo 140, parágrafo 3º do Código Penal diz respeito a injúria racial, prevendo pena de 1 a 3 anos com agravamento de 2 a 5 anos para quem faz apologia ao nazismo. O artigo 5º, inciso 42 da Constituição Federal prevê o racismo como crime inafiançável e imprescritível”, diz.

Ângela alerta ainda que todo e qualquer tipo de material ou declaração em apologia ao nazismo, impresso ou virtual, assim como tatuagens e objetos como bandeiras constituem crime previsto em lei. “Essa pessoa é enquadrada tanto na lei 7.716/89, no artigo 20, quanto no Código Penal, lembrando que este é um crime inafiançável. Se ela faz uma tatuagem com o símbolo nazista, isso não quer dizer que ela é nazista, mas é uma apologia e, por isso, ela pode ser penalizada”, explica.

Quanto ao preconceito sofrido por homossexuais, Ângela aponta a necessidade de uma lei específica para que a proteção a esse tipo de vítima ocorra de forma eficaz. “O agressor não responde especificamente por agredir um homossexual e, sim, pelo crime cometido como a agressão física. Mas, como nós sabemos que o que gerou a prática desse ilícito foi a discriminação pelo fato da opção sexual da vítima ser diferente da do agressor, então, creio ser necessário fazer uma revisão do nosso texto legal para majorar a questão da penalização nesses casos”, explica.

Quando o crime é praticado por menores de idade, como no caso de SP, o menor infrator não responderá criminalmente pela agressão. De acordo com a especialista em psicologia clínica, terapia de família e uso de drogas do Centro de referência, pesquisa, capacitação e atenção integral ao adolescente (Adolescentro), Michelle Falcão, a família exerce papel fundamental durante a ressocialização do adolescente.

“Vários meios de cuidados falharam para que o jovem infrator chegasse até aqui como a violência, as drogas, vínculos com grupos de risco, falta de projeto de vida, relações com a família, transtornos associados, etc. A família tem muita dificuldade de lidar com essa problemática por sentir culpada, sem esperança, cansada e magoada”,diz.

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