Debates sobre bibliodiversidade, equidade de gênero e protagonismo das culturas negras e indígenas nas políticas públicas marcaram o terceiro dia do IX Encontro Ibero-Americano de Redplanes, realizado na quarta-feira (15) no Museu de Arte do Rio (MAR). O evento, que segue até quinta-feira (16), reúne delegações governamentais e especialistas de 21 países para debater os desafios e caminhos comuns das políticas públicas de leitura na Iberoamérica.
A programação incluiu a Conferência principal sobre Leitura, conhecimento e democracia com Roger Chartier, professor e historiador do livro e da leitura (França), além de painéis sobre “Equidade racial e igualdade de gênero: prioridades da agenda do livro e da leitura” e “Línguas nativas e diversidade linguística na Ibero-América: oportunidades e desafios para as políticas do livro, da leitura, da escrita e da oralidade”.
O painel sobre equidade racial e de gênero contou com a participação de Danieli Christovão Balbi, professora e deputada da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Franciele Carneiro Garcês da Silva, professora adjunta na Faculdade de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal do Pará (UFPA), Margarita Cuéllar Barona, diretora do Cerlalc-Unesco e especialista em igualdade de gênero (Colômbia), com moderação de Dolores Prades, diretora do Instituto Emilia (Brasil).
A deputada Danieli Christovão Balbi destacou que as pessoas negras, especialmente mulheres negras no Rio de Janeiro, enfrentam mais dificuldades para concluir a formação básica e ingressar no mercado de trabalho formal. “É importante que essas práticas, essas ferramentas, a experiência do campo, do universo, do livro, da leitura, da escrita e da oralidade tragam as experiências com a literatura. E sejam não só produzidas por nós, pessoas pretas periféricas, mas a partir dessa produção e da priorização de práticas coletivas”, afirmou.
A professora Franciele Carneiro abordou o racismo e os debates na academia. “Quando chegamos às bibliotecas, me parece que nós precisamos ainda fomentar uma educação para as relações de gênero e raciais que estejam voltadas a pensar a representatividade e a participação ativa dos sujeitos dentro dos espaços e das bibliotecas. E sobretudo, o entendimento da biblioteca como dispositivo cultural, onde essa pessoa vai conseguir transformar suas realidades sociais”, frisou.
Margarita Barona destacou a falta de visibilidade e protagonismo das mulheres no mercado editorial. “Essas mulheres se formam nas áreas de publicação, chegam em uma editora grande, mas sofrem limitações, não podem tomar decisões altas. E então se emancipam e se formam em escolas pequenas, com muita mais dificuldades de trabalhar, com editoras especializadas. Mas estamos vendo como há um surgimento de vozes de mulheres na Latinoamérica. E essas vozes de mulheres costumam estar em editoras independentes ou menores”, ressaltou.
O painel sobre línguas nativas contou com a participação de Vanessa Sagica, professora efetiva da Secretaria Estadual de Educação de Santa Catarina, Alicia Sellés Carot, presidenta da Fundação FULL (Livro e Leitura) (Espanha), e moderação de Andressa Marques, coordenadora-geral do Livro e da Literatura do Ministério da Cultura.
Vanessa Sagica trouxe relatos pessoais sobre as dificuldades enfrentadas pelos povos indígenas. “Eu cresci com essa sensação de que eu não existia. Nunca li, na minha infância, um livro escrito por indígenas. Meu pai nunca foi reconhecido pela vizinhança como indígena, achavam que ele era estrangeiro por ele não falar o português, ele fala o nosso idioma”, relatou. Ela enfatizou que “a nossa língua é um ser vivo e como ser precisa de políticas e de projetos. Para nós, ela é denominada por língua-espírito”.
Alicia Sellés Carot ressaltou a importância da diversidade linguística. “Temos que reconhecer que a diversidade linguística é um valor democrático. É necessário reflorestar as mentes, ter, com as nossas línguas, uma vida em plenitude. E que todos nós, por meio da literatura, possamos ter mais justiça social”, afirmou.
Na conferência sobre conhecimento e democracia, Roger Chartier abordou os desafios contemporâneos da leitura. “Temos que pensar políticas públicas para permitir o acesso de cada um aos livros e o que isso proporciona, o que procuram saber, que permitem pensar, imaginar ou sonhar. Mas fazê-lo seria ignorar que nosso tempo lança um desafio inédito: esta leitura mesmo, que se encontra armazenada, um tipo de leitura, entendemos uma prática paciente, reflexiva, crítica de apropriação do que está escrito”, frisou.
O professor também refletiu sobre o impacto das tecnologias digitais na leitura. “Em frente às telas, para ir ao posto ou para o lazer, em casa ou no passeio ou na sala de aula, os leitores acabam se apoiando cada vez mais em textos digitados, mensagens de batalhas online por comunicações de correio eletrônico, informações em tempo real, artigos de revistas ou de periódicos, capítulos de livros digitalizados. Tudo isso exige que estejamos onipresentes e disponíveis em todos os momentos da vida. E sendo obrigados a termos aceleração na leitura”, explanou.
A programação também incluiu a apresentação dos resultados do estudo regional sobre políticas públicas e planos nacionais de leitura na Ibero-América, conversa sobre leitura, resistência e comunidade, painel sobre bibliotecas como motores de mudança e desenvolvimento, e a apresentação do dossiê Cerlalc sobre questões-chave para orientar as políticas de leitura na região.
O encontro é uma iniciativa do Centro Regional para o Fomento do Livro na América Latina e o Caribe (Cerlalc), em parceria com o MinC, o MEC e a OEI, com o objetivo de fortalecer a leitura, a escrita e a oralidade como instrumentos de cidadania e desenvolvimento democrático. As mesas e painéis estão sendo transmitidas no canal do Youtube do MinC.
Fonte: Ministério da Cultura