Representantes da sociedade civil se reuniram no segundo dia da Conferência da Diáspora Africana nas Américas, nesta sexta-feira (30), em Salvador (BA), para elaborar a Carta de Recomendação da Conferência da Diáspora Africana nas Américas. O documento, fruto de intensos debates ao longo do dia, será entregue aos representantes da União Africana, durante uma reunião ministerial amanhã (31).
A construção da carta envolveu discussões organizadas em quatro eixos centrais: pan-africanismo; memória; reconstrução; reparação e restituição.
Metodologia
As rodas de conversa seguiram uma metodologia estruturada: começando com a leitura das regras e a pactuação da dinâmica de trabalho, seguida pela apresentação das Notas Conceituais, que serviram como base para as discussões. Cada grupo, composto por até 50 participantes, formulou recomendações, que foram compiladas em um documento ao final do dia.
Jaqueline Fernandes, presidenta do Instituto Afrolatinas, sublinhou a importância de valorizar as narrativas afrodescendentes. “Que este documento possa refletir a diversidade de memórias, histórias e também de lutas que conectam a África com a Diáspora. Essas perspectivas da sociedade civil, quando forem incorporadas ao documento, vão trazer mais efetividade, mais legitimidade ao processo, garantindo que a gente possa ampliar as nossas abordagens para os processos de governança global. A arte e a cultura são determinantes nisso”, disse.
Luan Apollo Ribeiro Santos, representante da Rede LGBT de Memória e Museologia Social e membro do Conselho Consultivo do Patrimônio Museológico, do Instituto Brasileiro de Museus, destacou sua satisfação em participar da conferência. “É uma construção muito importante, representando o setor museal e também a comunidade LGBTQIA+”, afirmou.
Mesa plenária
A mesa plenária contou com a participação de importantes lideranças e representantes, incluindo Roberta Eugênia (Ministério de Relações Exteriores – MRE), Jessy Daiana (Secretaria-Geral Presidência da República – PR), Roberta Martins (Secretaria dos Comitês de Cultura – SCC/Ministério da Cultura – MinC), embaixador Carlos Duarte (Secretaria África e Oriente Médio, MRE), Edmilton Cerqueira (Secretaria de Territórios/Sistemas Produtivos Quilombola/Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar – MDA), João Jorge (FCP), Tomas (Ministério de Direitos Humanos e Cidadania – MDHC), Daniele Costa (Secretaria de Promoção da Igualdade Racial e dos Povos e Comunidades Tradicionais – Sepromi), e João Bosco (Instituto Brasil África – Ibraf).
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, emocionada, destacou a importância do evento e a força da ancestralidade. “Este encontro, além de toda a emoção que simboliza, é um momento de reverenciar todas as gerações presentes e todas as que ajudaram a construir esse momento. Hoje é um dia especial, uma semana de justiça, e quando mais precisei, foi o movimento de mulheres negras que me sustentou. Nossa história não traz apenas dor, mas também resiliência e força. A nossa luta é coletiva e, enquanto estivermos aqui, honraremos cada passo dado antes de nós”, afirmou.
Angela Guimarães, por sua vez, ressuscitou a relevância histórica do encontro e a conexão com a União Africana. “Este é um momento histórico pelo reconhecimento do Brasil como uma sexta região da diáspora africana nas Américas. Estamos fazendo história ao propor uma relação diplomática de horizontalidade, compartilhamento de responsabilidades, e uma agenda de memória, restauração, restituição e reconstrução”, declarou.
Próximos passos
O documento resultante dessas discussões, a Carta de Recomendação da Conferência da Diáspora Africana nas Américas, será apresentado à União Africana e contribuirá para os debates do 9º Congresso Pan-Africano, que ocorrerá de 29 de outubro a 2 de novembro de 2024, em Lomé, Togo. Além disso, a carta, as Notas Conceituais e o Relatório da Conferência serão publicados em plataformas específicas para garantir ampla divulgação.
Pai Geová D’Kavungo, membro do Conselho Nacional de Cultura, também contribuiu com sua perspectiva: “Para fortalecer o pan-africanismo, a nossa contribuição no grupo foi que a educação e a cultura são a base de tudo”, afirmou.
Para a professora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Matilde Ribeiro, “discutir reconstrução significa partir do reconhecimento que a África, com seus 55 países, é um continente civilizatório, e que o Brasil é formado por maioria de africanos. Então, nós temos que estreitar os nossos diálogos, de maneira que valorize a nossa existência no Brasil e a nossa conexão com a África”.
“Nós tivemos aqui, ao longo desses dois dias, a contribuição central de lideranças, ativistas, representantes de conselhos, e toda essa contribuição que está, hoje, concentrada no documento que vai informar o Congresso Pan-Africano em Lomé, ela também dá impulso para as nossas estratégias afro-diaspóricas no Brasil”, completou Roberta Eugênia, do Ministério da Igualdade Racial (MIR).
João Jorge, presidente da Fundação Cultural Palmares (FCP), arrematou: “Construção importantíssima para nossa ancestralidade, atualidade e futuro. Muitas vezes, nós somos panafricanistas no candomblé, na capoeira, na música, nas cores, nas roupas, mas agora é hora de aprofundar essa essência, e saber da história de como esse pan-africanismo fez o movimento negro resistir desde muito tempo atrás. A minha mensagem é que a gente olhe para a África, olhe para a América Latina, para o Caribe e para a diáspora africana para fazer a nossa reflexão”.
Fonte: Ministério da Cultura