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No Amazonas, filhos de mulher indígena tiram certidão de nascimento 15 anos após morte da mãe

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Três jovens indígenas, moradores da comunidade Marari, localizada na fronteira com a Venezuela, em terra indígena Yanomami, no interior do Amazonas, conseguiram pela primeira vez o seu registro de nascimento, durante ação do projeto “Cidadania dos Povos Originários – O Registro Civil que Transforma Vidas”, realizado pelo cartório extrajudicial de Barcelos entre os dias 4 e 10 deste mês, com apoio de vários órgãos. Para obter o documento, foi preciso acionar a Justiça porque a mãe dos jovens, falecida há 15 anos, não tinha certidão de nascimento, o que impedia a emissão do registro dos seus três filhos.

O cartório extrajudicial entrou em contato com o Ministério Público Estadual, que requereu da Justiça a autorização para o registro de nascimento e de óbito tardio de Renata Aprueteri Yanomami, a mãe dos jovens, no último dia 6 de dezembro, bem como a certidão de nascimento de todos os filhos. Ela faleceu aos 30 anos, em agosto de 2008, três dias após o parto do seu último filho, “sem que tivesse constituído sua cidadania para exercício de seus atos civis”, de acordo com trecho dos autos.

“O pleito de jurisdição voluntária encontra guarida expressa na regra legal dos arts. 109 a 111 da Lei n.º 6.015/73. Dos documentos juntados aos autos é possível extrair todas as informações necessárias à expedição dos registros civis de nascimento, além do de registro de óbito. (…) Além disso, considerando que os seus filhos não possuem registro de nascimento, necessário também o deferimento do pedido”, observou a juíza Tamiris Gualberto Figueiredo, titular da Vara Única da Comarca de Barcelos, a 401 quilômetros da capital Manaus, em sua sentença, proferida no mesmo dia da petição. A certidão de nascimento é que oficializa a existência do indivíduo no País, que passa a ter nome, sobrenome, nacionalidade e filiação. É essencial para a obtenção de outros documentos e também para assegurar o acesso a benefícios governamentais e a projetos públicos.

De acordo com a responsável pelo cartório extrajudicial de Barcelos, Geiza Elem Souza de Matos, casos como esse têm sido verificados com frequência nas ações de cidadania realizadas nesta região. Somente na segunda edição do projeto, na semana passada, foram encontrados cinco casos semelhantes. “Mas é um problema recorrente infelizmente, e também complexo, assim como o registro de muitos idosos”, comentou Geiza, destacando, ainda, a agilidade do Judiciário, MP e Defensoria Pública no atendimento a esses casos.

No total, o cartório contabilizou 551 atendimentos, entre retificações, registro de nascimento e de óbito, ao longo dos oito dias de trabalho na comunidade indígena, realizado em apoio da Funai e da Associação dos Notários e Registradores do Amazonas (Anoreg/AM). “É uma ação de cidadania que está transformando vidas, especialmente pela emissão da certidão de nascimento (1.ª e 2.ª vias), entre outros serviços”, continuou Geiza Matos.

Para o corregedor-geral de Justiça do Amazonas, desembargador Jomar Fernandes, iniciativas como essa são vistas como “Boas Práticas” pelo órgão correcional pela importância de se levar cidadania, por meio de um esforço coletivo, às pessoas desprotegidas social e economicamente. “Essa ação cumpre o Provimento n.º 140/2023, da Corregedoria Nacional de Justiça, que tem entre as suas diretrizes a intenção de erradicar o sub-registro civil de nascimento e ampliar o acesso à documentação civil básica ao cidadão”, disse o corregedor.

Barreiras linguísticas, culturais e geográficas

No início de novembro, o projeto “Cidadania dos Povos Originários”, do cartório extrajudicial de Barcelos, foi realizada a primeira etapa do projeto-piloto para implementação de um posto de atendimento virtual do cartório extrajudicial em Marari, com apoio da Funai.

Em razão da distância entre a comunidade e a sede do município de Barcelos, foi necessário o uso de helicóptero até o local, levando aproximadamente três horas de voo. “O projeto tem como objetivo diminuir distâncias entre a atividade extrajudicial e a sociedade. Atualmente, a população de Marari precisa de 10 a 15 dias, em embarcações de pequeno porte, para chegar à sede do município e isso tem um custo alto por conta do valor do combustível. Por isso, é importante a implementação do posto de atendimento virtual no local”, explicou a registradora.

Na primeira fase do projeto, em novembro, ocorreram conversas com membros da comunidade para verificar a necessidades das famílias, sobretudo em relação ao sub-registro civil, que é tema abraçado pelas Corregedorias de Justiça de todo o País, com a finalidade combater a falta da certidão de nascimento entre os cidadãos. Também houve ênfase à necessidade e importância da conservação desse documento. “O diálogo e a anuência das lideranças indígenas permitiu o esclarecimento de dúvidas recorrentes da população indígena. Entre os dias 9 e 29 de novembro, foram recepcionados 417 atendimentos, com a realização de triagem de documentos e entrevistas remotas. Na segunda etapa do projeto, levantamos a eficácia do balcão virtual e entregamos os registros solicitados”, completou Geiza.

O cartório extrajudicial de Barcelos atuou com apenas dois funcionários e dois estagiários, permanecendo inalterada a rotina da serventia na sede do município. “Em razão da população indígena Yanomami ser considerada de recente contato, o projeto tem superado barreiras linguísticas e culturais, graças à criação da rede intersetorial do combate ao sub-registro da população indígena e alinhamento com lideranças”, contou a titular do cartório, enfatizando o apoio logístico da Funai, assim como a cessão dos equipamentos pela Anoreg/AM.

Fonte: TJAM

Fonte: Portal CNJ

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