A batida do Hip-Hop ecoa pelo Território Indígena do Xingu (TIX), levando com ela um grito de resistência e identidade. O projeto Do Chão da Aldeia pro Topo do Mundo, idealizado pelos grupos Nativos MC’s (Kuikuro) e RAP Yudjá, é uma dessas iniciativas que transformam a cultura em ferramenta de empoderamento.
“O Hip-Hop permite que a gente fale sobre nossas experiências e os desafios do nosso povo. Ele não substitui nossa cultura, ele fortalece nossa identidade, misturando samples de cantos tradicionais com beats modernos, e grafismos tradicionais com grafite”, explica Urysse Kuikuro, do grupo Nativos MCs.
Com recursos da Lei Paulo Gustavo (LPG), por meio do edital Identidade do programa Viver Culturas, da Secretaria de Cultura, Esporte e Lazer do Estado de Mato Grosso, o projeto recebeu um investimento de R$ 50 mil. Ele permite que jovens indígenas unam suas línguas maternas à musicalidade do RAP/TRAP. As faixas do EP, que será lançado em 2025, trarão letras em português e nos idiomas Karib (Kuikuro) e Tupi (Yudjá), abordando temáticas como a luta pelo território, o enfrentamento ao Marco Temporal e as mudanças climáticas.
Para além da gravação musical, o projeto também promove rodas de conversa e oficinas nas aldeias Afukuri e Tuba Tuba, integrando jovens ao universo da produção musical, do grafite e da comunicação digital como formas de expressão e defesa da identidade indígena.
“Entendemos que como MC’s queremos fortalecer nossa comunidade e que outros jovens tenham a oportunidade de seguir seus sonhos no Hip-Hop. Aqui temos os desafios econômicos, sociais e geográficos enfrentados por nossas comunidades, e vimos no Hip-Hop uma poderosa ferramenta de resistência e expressão”, explica Madu Juruna, do grupo Rap Yudjá.
O grupo Nativos MCs é composto pelos indígenas: Urysse Kuikuro, Mupuri Kuikuro e Makulan Kuikuro. Já o Rap Yudjá por Madu Juruna, Yade Juruna, Thales Juruna e Kaick Juruna.
O Ministério da Cultura (MinC) tem implementado políticas afirmativas para fortalecer e valorizar as culturas indígenas. A Política Nacional de Cultura Viva certifica e financia Pontos de Cultura indígenas, enquanto o Edital Sérgio Mamberti, lançado em 2023, premiou 110 iniciativas culturais indígenas com R$ 30 mil cada. Além disso, a Lei Paulo Gustavo e a Política Nacional Aldir Blanc destinam 10% dos recursos para projetos indígenas, ampliando o acesso dessas comunidades ao fomento cultural.
Em 2023, o MinC lançou um edital para Pontões de Cultura, contemplando um Pontão específico para as culturas indígenas, coordenado pela Casa de Cultura Cavaleiro de Jorge, em Alto Paraíso (GO). O projeto articula diversos Pontos de Cultura indígenas pelo país e formou 20 jovens indígenas como Agentes Cultura Viva, que recebem uma bolsa mensal de R$ 900,00 por oito meses, para apoiar e desenvolver atividades culturais em suas comunidades.
“Com a seleção de Pontões territoriais, nacionais e temáticos, incluindo específicos para culturas tradicionais e populares, matriz africana e culturas indígenas, buscamos ampliar o mapeamento, a articulação e o apoio às iniciativas culturais que promovem o protagonismo dos povos originários e tradicionais e a valorização de suas expressões culturais. Os Pontões estão realizando um excelente trabalho, conectando essas comunidades às políticas culturais”, explicou a secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do MinC, Márcia Rollemberg.
O MinC premia iniciativas culturais indígenas desde 2008, e o Prêmio Vovó Bernaldina, parte do Edital Sérgio Mamberti, representa a 5ª edição desse reconhecimento. Essas ações visam preservar, valorizar e promover as culturas indígenas, reconhecendo tanto práticas tradicionais quanto expressões contemporâneas.
Elo entre o passado e o futuro
Outro projeto que se destaca na cena cultural indígena é a Orquestra Indígena Teko Arandu, localizada em Anastácio, Mato Grosso do Sul. Criada em 2013, a iniciativa oferece formação musical gratuita para jovens da etnia Terena, combinando instrumentos de sopro, cordas e percussão com influências da cultura tradicional.
O coordenador do projeto, Adriano Castro, ressalta que, apesar dos desafios financeiros, a orquestra conseguiu se manter ativa graças ao apoio da Lei Paulo Gustavo. “Fomos contemplados no edital 11/2023, voltado para cultura popular e indígena. Esse recurso tem sido essencial para a aquisição de novos instrumentos e para a ampliação do número de alunos atendidos”. O projeto recebeu um investimento de R$ 75 mil.
Mais do que ensinar música, a orquestra tem sido um espaço de fortalecimento da identidade indígena e de desenvolvimento social.
“A música instrumental tem um impacto muito positivo nos jovens indígenas. Buscamos incorporar influências da tradição e simbologia indígena no projeto, trazendo elementos culturais que dialogam com a identidade dos alunos. Além disso, a participação na orquestra ajuda a desenvolver sua interação social e confiança, o que também reflete no desempenho escolar, contribuindo para a educação integral desses jovens”, explicou Adriano Castro.
Leitura nas comunidades
A literatura também se mostra uma poderosa ferramenta de inclusão e pertencimento. No Amazonas, o projeto Leiturinha Ribeirinha, criado por Keila Gama em Santa Isabel do Rio Negro, busca levar o acesso aos livros para comunidades sem bibliotecas ou livrarias.
Contemplado pelo edital de Fomento às Artes da Lei Paulo Gustavo, o projeto recebeu R$ 25 mil e investiu na confecção de estantes em formato de casas, distribuídas pelas comunidades, incentivando a troca de livros entre crianças e adolescentes. Keila destaca o impacto positivo da iniciativa. “Ver o sorriso das crianças ao receber um livro e se encantar com a leitura é a maior recompensa. O projeto integra jovens de diferentes etnias, promovendo trocas culturais e fortalecendo a educação na região”.
Para a secretária dos Comitês de Cultura do MinC, Roberta Martins, apoiar iniciativas culturais dos povos originários vai além da preservação das tradições, representando um caminho para o fortalecimento da diversidade e da identidade nacional.
“A cultura indígena é parte essencial da identidade do Brasil. Fomentar ações culturais dos povos originários é reconhecer que suas expressões artísticas são fundamentais para o futuro do país”, afirma.
7 de fevereiro: Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas
O Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas, celebrado em 7 de fevereiro, foi instituído em 2008 para homenagear a resistência e a luta histórica dos povos originários do Brasil. A data rememora a trajetória de Sepé Tiaraju, liderança guarani que tombou em 1756 na defesa de seu território contra a invasão colonial.
Iniciativas como Do Chão da Aldeia pro Topo do Mundo, Orquestra Indígena Teko Arandu e Leiturinha Ribeirinha refletem o protagonismo indígena na cultura nacional e o fortalecimento de expressões artísticas e identitárias.
Segundo Márcia Rollemberg, o incentivo às culturas indígenas é essencial para a valorização e a perpetuação das expressões artísticas e dos conhecimentos tradicionais dos povos originários.
“As práticas tradicionais indígenas têm um papel fundamental na proteção de ecossistemas. Estamos juntos dos povos originários nesse processo de reconhecimento, de valorização e de promoção desses saberes e práticas ancestrais e contemporâneas. Investir e valorizar as culturas indígenas é reconhecer sua centralidade na formação do Brasil e promover políticas que respeitam a diversidade e a autodeterminação dessas comunidades”, disse.
Fonte: Ministério da Cultura